A guerra invisível: o abismo social das crianças no Brasil
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No último mês, o projeto batizado de “Novo Socioeducativo” voltou a ser destaque após roadshow, no qual foram apresentados empresas e consórcios interessados em se tornarem parceiros da iniciativa. O projeto foi aprovado em dezembro de 2020 pela Assembleia Legislativa de Minas Gerais e prevê mudanças no atendimento a adolescentes em conflito com a lei, com o objetivo de tornar o sistema mais eficiente e humano.
De uma forma geral, o projeto prevê ser mais efetivo na responsabilização dos jovens, respeitando direitos garantidos pelo Estatuto da Criança e do Adolescente e ampliando as chances de rompimento da trajetória infracional.
Isso inclui a construção, a gestão e o atendimento através da parceria público-privada. Em um primeiro momento, o projeto será implementado no estado de Minas Gerais, com a intenção de ser um modelo para os outros estados brasileiros.
No entanto, se o “Novo Socioeducativo” tem como objetivo ser mais efetivo na responsabilização dos jovens, por que os estados de Minas Gerais e Santa Catarina estão na contramão do movimento de desencarceramento?
Com a parceria público-privada, está prevista a construção de mais duas unidades socioeducativas masculinas, com 90 vagas cada no estado de Minas Gerais, que alega déficit de vagas. Porém, em julho de 2022, havia 1.750 vagas nos centros socioeducativos para 1.093 adolescentes, ou seja, a superlotação não é uma realidade do estado. Então, será que realmente é necessário a construção de novas unidades?
Além disso, o valor mensal do contrato com a empresa privada será de R$ 2.98 MM e, se os indicadores de desempenho forem inadequados, haverá uma redução de até 20% do valor, sendo R$ 2.38 MM. O valor do contrato não altera, independentemente do número de adolescentes nessas unidades. Se fizermos uma conta rápida, cada adolescente em privação de liberdade representará em torno de R$ 16 mil, mas a vida desse adolescente só tem valor quando está em privação de liberdade?
A responsabilidade e garantia das nossas crianças e adolescentes precisam existir antes, durante e após as medidas socioeducativas. A parceria público-privada representa ainda mais encarceramento, medidas punitivas e mais tempo de privação, e não podemos nos esquecer do lucro.
A privação de liberdade de crianças e adolescentes deve ser decidida apenas em último caso e pelo menor espaço de tempo possível, sendo de caráter excepcional, de acordo com o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente).
Outro exemplo de como o denominado “Novo Socioeducativo” está na contramão é o movimento de desencarceramento que está sendo discutido principalmente no estado da Califórnia (EUA), justamente por compreender que a privação de liberdade não é um agente de transformação. Em primeiro lugar, a criança ou o adolescente não sai da privação melhor do que entrou devido a quebra de vínculo com sua família e comunidade; em segundo, se não tiver os seus direitos garantidos, as chances de reincidências são muito maiores porque existe uma deficiência de oportunidades antes e no pós medida (no qual o setor privado poderia se envolver mais).
O valor investido em contrato com empresas privadas e no projeto deveria ser destinado à melhoria dos centros que já existem, uma vez que, de acordo com o relatório do Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura em Minas Gerais, pelo menos dois centros socioeducativos femininos estão em condições insalubres, além da criação de capacitação humanizada para os agentes e educadores socioeducativos, além de programas de reintegração para esses adolescentes.
Nesse sentido, o Mundo Aflora reforça ser contrária à adoção do modelo de cogestão no sistema socioeducativo do Estado de Minas Gerais, pois não podemos capitalizar a vida de jovens em conflito com a lei, reforçar o caráter punitivo baseado na visão prisional e a diminuição da possibilidade de garantia de direito por meio da gestão privada.
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