A guerra invisível: o abismo social das crianças no Brasil
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Têm dias em que acordamos com o pé direito, felizes, com um sorriso no rosto, dando bom dia para as pessoas com as quais vivemos, para as pessoas que encontramos no elevador, para os passarinhos, as flores e até para a nossa própria sombra. Mas também existem dias em que não queremos ver ninguém, em que é difícil sair da cama até mesmo para ir ao banheiro. Isso é a vida! Todos os dias acontecem coisas diferentes e mesmo que não tenhamos consciência dessas diferenças e achemos que os dias são sempre iguais, a cada hora estamos de um jeito. Num dia estamos felizes, noutro nem tanto. Num dia temos um verão em pleno agosto e noutro estamos num inverno típico do Canadá. Às vezes, essas mudanças ocorrem em questão de horas, até minutos.
Sabemos que essas transformações acontecem toda vez que o ponteiro do relógio se movimenta, mas não nos damos conta da maior parte dessas mudanças. A cada segundo alguma coisa nova está ocorrendo. As células do nosso corpo, por exemplo, renovam-se completamente a cada sete anos sem nos darmos conta disso. Nossos pensamentos e emoções mudam a cada instante sem a nossa permissão. Então, por que não conseguimos perceber as mudanças da vida e muitas vezes temos pavor delas? Porque somos condicionados a agir dessa forma. Estamos sempre fazendo alguma coisa, sem nem sabemos direito o porquê. Nos relacionamos com pessoas sem saber ao certo a razão, trabalhamos em lugares ou com determinadas pessoas sem nos questionarmos de onde queremos chegar. Muitas vezes, abandonamos o nosso corpo para priorizarmos o intelecto e esquecemos que ele possui uma função. Ou, valorizamos demais o corpo e nos esquecemos de nossa mente. E aí, depois de algumas décadas, nos damos conta que estamos infelizes nas nossas relações ou com o nosso trabalho ou com o nosso corpo, pois simplesmente esquecemos de olhar o que estava acontecendo ao nosso redor, não questionamos se as mudanças que estavam acontecendo, nos vários setores de nossas vidas, estavam de acordo com o que queríamos para nós. É como se pegássemos um trem para ir a uma cidade, dormíssemos durante a viagem e acordássemos numa cidade completamente desconhecida e situada num local completamente diferente daquele que tínhamos planejado. Nenhuma mudança é muito brusca e como, normalmente, ela acontece lentamente, quando ela se completa, nos pega de surpresa porque não estamos acostumados a prestar atenção a essa movimentação.
No mundo relativo, onde existe o lado positivo e o lado negativo sempre teremos mudanças. Na adolescência, vamos amar jogar futebol, mas aos 70 anos, mesmo que continuemos amando jogar futebol, não poderemos mais praticá-lo da mesma forma. Aprender a respeitar as mudanças da vida nos ajuda a lidar com situações difíceis e ter maturidade emocional para resolver problemas. Quando negamos uma realidade porque não nos sentimos confortáveis com ela acabamos nos prejudicando e sofrendo. Grande parte do nosso sofrimento vem de não compreendermos a impermanência e do apego que temos às coisas que possuem uma duração limitada como, por exemplo, o nosso corpo. Por cultuarmos essa ilusão, passamos nossa vida inteira achando que somos algo que não somos e quando nos questionamos de quem realmente somos, entramos em crise. Um ótimo exercício de atenção e meditação é olharmos para as coisas e as pessoas (incluindo nós mesmos) e tentarmos descobrir quem realmente somos, sem agregarmos valores próximos ou quaisquer privilégios físicos ou emocionais. Isso faz com que sejamos objetivos conosco e com quem nos relacionamos.
Se parássemos um pouco para observar o mundo, perceberíamos que tudo tem um ciclo, como as estações do ano, a rotação da Terra, as etapas das nossas vidas (infância, adolescência, maturidade e pós-maturidade), as frutas e legumes, o nosso corpo; tudo está suscetível a transformações em função do tempo. Isso é a realidade da vida e quando aprendemos que essa realidade é mudança, é impermanência, a vida fica mais bonita, pois conseguimos apreciar cada mudança como natural, algo que nos permite amadurecer, melhorar como seres humanos em todos os níveis, desde o cuidado com o nosso corpo até na forma como nos relacionamos com o outro. Da mesma maneira que as águas de um rio vão desenhando as margens por onde passam, desviando-se dos obstáculos, fazendo curvas, moldando pedras, deixando-se habitar por outros seres vivos, até desembocar no mar, ou até secar, nós passamos pela vida para lidar com as mudanças que nela acontecem, para ficarmos abertos para aprender, entender, fazer o igual de forma diferente, para sermos genuinamente nós mesmos e antes de fazermos algo, sejamos o algo que estejamos fazendo. Pois, afinal de contas, a beleza dessa impermanência é nos permitir escolher nossas ações, escolher nossas mudanças, da forma que quisermos, de acordo com os nossos valores e prioridades.
Viver uma vida, sem lidar com as mudanças, é a mesma coisa que viver uma vida sem vida.
Renata Mendes, fundadora do Instituto Mundo Aflora e do Actveda.
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